Vivemos um período tão excepcional na história econômica do Brasil a ponto de merecer um registro digital para os estudarmos, analiticamente, mais adiante. Teremos então um necessário distanciamento histórico, para o tratarmos de maneira racional – e não tão emocional, como agora, quando vivemos o luto da morte de mais de ½ milhão de brasileiros e mais de 4 milhões de seres humanos no planeta.
Mas “no meio do caminho tinha uma pedra, tinha uma pedra no meio do caminho”. Carlos Drummond de Andrade nos inspira, isto é, à geração de “pedras rolantes”. Temos de remover mais uma “pedra” do caminho, mais uma ameaça de golpe de Estado no Brasil.
“Lapis volvens nihil musci”. Curiosidade etimológica: o significado de “lápis”, em latim, é pedra, e daí vem lápide, lapidação.
Há duas possíveis mensagens no provérbio em latim. Primeira, a pessoa não se firma em um ponto, não se estabiliza. Segunda, a pessoa ao se mover, não cria amarras, se renova constantemente.
Muddy Waters (“águas lamacentas”) compôs um blues e o denominou de Rolling Stone. Em seu uso da metáfora “pedra rolante não cria musgo”, ele se refere à pessoa errante.
Em 1962, ao falar ao telefone com um repórter da revista Jazz News, para a divulgação do grupo para a imprensa, o recém incorporado guitarrista Brian Jones se esquece do nome do grupo The Blues Boys formado por Mick Jagger e Keith Richards. Então, vê no chão um LP com uma coletânea de composições de Muddy Waters, simpatiza com o título da música “Rollling Stone”, e assim batiza a banda.
Bob Dylan compôs uma música chamada Like a Rolling Stone, em 1965, com sentido negativo de uma pessoa outrora rica ao ficar pobre ter sofrido muito por conta de seu temperamento arrogante nos tempos de fartura. O manuscrito da canção de grande sucesso, escrito a lápis (predestinado), foi leiloado por US$ 2 milhões.
Finalmente, em 1967, é criada a revista Rolling Stone, para a leitura da geração 68. Esta parece estar predestinada à Tarefa de Sísifo.
Sísifo tornou-se conhecido por executar um trabalho rotineiro e cansativo: empurrar uma pedra rolante ao topo e não se assegurar dela lá ficar. Tratava-se de um castigo para mostrar-lhe os mortais não terem a liberdade dos deuses.
Os brasileiros mortais têm a liberdade de escolha tolhida pelos PhDeuses aliados aos militares-milicianos. Deveriam, em princípio, concentrar-se nos afazeres da vida cotidiana – e aceitar passivamente serem “idiotas” pelo desinteresse quanto à coisa pública.
Para os gregos da Antiguidade Clássica, era “idiota” qualquer sujeito ao abdicar de suas prerrogativas para participar da vida pública na polis. Ao não defender a democracia republicana, não tinha a consciência do mal feito a si e aos outros cidadãos pela abdicação do direito à liberdade.
Vivendo nosso cotidiano em sua plenitude, como cidadãos ativistas e críticos, tornamo-nos criativos frente à repetição do dia-a-dia – e afastamos a monotonia alienante. Somos todos, enquanto participantes no debate sobre o nosso futuro, intelectuais públicos.
Esses hommes de lettres, no contexto da revolução francesa, ocuparam a cena pública e engajaram-se na política, aliando a pena e a baioneta. Certamente, essa não é a única maneira de exercer o ofício de intelectual, nem a sua forma completa ou acabada.
A academia e o mundo das letras conhecem outros tipos de intelectuais e outras maneiras de exercer o ofício. Há a reclusão letrada, longe das disputas acadêmicas, da assessoria dos negócios e do mundo da política partidária. Há também a vida do professor de Humanidades, refugiado em seu gabinete, e a do cientista trancado no laboratório, de costas para o mundo. Não é esta a nossa opção.
A próxima eleição nos exigirá a escolha de um novo projeto nacional. A demanda social será por uma política econômica para a retomada do crescimento da renda e do emprego e um planejamento para sustentar esse crescimento econômico em longo prazo com menor desigualdade social de renda e riqueza.
Em crônica argumentativa, o intuito do autor é apenas apresentar sua opinião, sem necessidade de provar nada. Neste livro, além de resumir minha pesquisa jornalística sobre assuntos referentes à política econômica em curto prazo e ao planejamento econômico em longo prazo, em artigos de opinião, defendo um ponto de vista e utilizo argumentos para justificá-la – e tentar convencer a você, leitor.
Fernando Nogueira da Costa