Carta Maior, 15 de agosto de 2012
“Há a necessidade que o Brasil, que tem um grande banco de desenvolvimento e grandes empresas estatais, assuma suas responsabilidades no bloco. Além disso, é preciso que se transforme o Mercosul em uma agência de desenvolvimento, que se leve em consideração que há países em relações aos quais há necessidades de se fazer grandes investimentos”, defendeu Samuel Pinheiro Guimarães durante congresso do Centro Celso Furtado.
Rodrigo Otávio
Rio de Janeiro - O embaixador Samuel Pinheiro Guimarães, ex-Alto Representante Geral do Mercosul, defende que uma das rotas de avanço para o bloco regional, fora a importante adesão da Venezuela, é ele atuar antes como uma agência de desenvolvimento para minimizar as desigualdades da região do que apenas como o regulador de mercado que possa estar embutido em seu batismo. A partir daí sim, com o crescimento interno seria possível fomentar uma realidade de mercado que aos poucos deixasse de apresentar os integrantes do bloco como meros exportadores de commodities nas rotas transcontinentais. E essa transformação só se dará quando o Brasil de fato liderar esse processo, mais especificamente através do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), o único banco de fomento da região.
“Há a necessidade que o Brasil, que tem um grande banco de desenvolvimento e grandes empresas estatais, assuma suas responsabilidades no bloco. Em segundo lugar é preciso que se modifique e se transforme o Mercosul em uma agência de desenvolvimento, que se leve em consideração que há países em relações aos quais há necessidades de se fazer grandes investimentos”, afirmou ele durante a palestra “Integração da América do Sul: Desafios do Desenvolvimento Regional no séc. XXI”, realizada no 1º Congresso Internacional do Centro Celso Furtado, na quarta-feira (15), no Rio de Janeiro.
O embaixador reconhece que o BNDES “tem feito alguma coisa, mas com muita modéstia, com muita relutância” para estender as linhas de crédito aos países vizinhos para obras de longo prazo que igualem as condições de infraestrutura, “porque, como no Brasil, a banca privada não financia investimento de longo prazo em infraestrutura, simplesmente não financia!”.
Campo neutro
“É necessário que haja uma equalização das condições, para que as empresas, ao decidirem seus investimentos, não levassem em conta as condições melhores que oferecem os mercados maiores”, afirmou Guimarães, completando que a grande parte do comércio do bloco é feita por empresas multinacionais.
Segundo o embaixador, esse é um dos grandes problemas do Mercosul, “porque naturalmente os estados menores não podem se beneficiar na mesma medida do que os estados maiores no processo comercial, já que a dimensão das empresas multinacionais é muito diferente. E ademais porque os estados maiores, nos setores em que os estados menores têm alguma competitividade, se esmeram em colocar todo tipo de obstáculo, do que se aproveitam outros agentes de fora (do Mercosul) para acenar aos estados menores”.
Regras
Neste quadro, além da assimetria da região, o embaixador apontou o segundo empecilho para o crescimento do Mercosul: o livre mercado. “A crença no livre comércio como fator de desenvolvimento é um negócio extraordinariamente prejudicial, e mitológico. O livre comércio só beneficia os maiores. É óbvio”.
Como remédio, sentenciou ser necessário regulamentar o comércio. “Isso é novidade? Não! O acordo automotivo entre o Brasil, a Argentina, e também o Uruguai, determina certas regras que estimulam as empresas multinacionais a realizarem investimentos nos três países. Isso é necessário ser feito em outros setores”.
Para o embaixador, a regulação vai de encontro aos fundamentos do bloco, entre eles a ampliação e diversificação do mercado, “que, em princípio, dependendo das políticas aplicadas, permite maiores níveis de renda, maiores salários e melhores situações sociais”.