Historicamente os movimentos sociais sempre foram um fator de pressão para fazer avançar a democracia. No Brasil, eles tiveram peso preponderante em importantes conquistas sociais recentes: no estabelecimento das eleições diretas, na elaboração da Constituição de 88 e no impeachment do presidente Collor, para citar apenas três. A partir do governo Lula, os movimentos sociais passam a viver uma nova fase, com a própria Presidência da República sendo exercida por um de seus mais diletos representantes.
O que isso significou para os movimentos sociais: cooptação pelo poder ou oportunidade para se aprofundar as conquistas democráticas? Essas e outras questões vão estar em discussão na mesa Os movimentos sociais e o desenvolvimento brasileiro durante o I Congresso Internacional do Centro Celso Furtado. Coordenada pela historiadora Dulce Pandolfi, da Fundação Getúlio Vargas, a mesa já tem confirmadas as presenças de três importantes lideranças sociais brasileiras: João Pedro Stédile, Itamar Silva e Betânia Ávila.
“Essa é uma mesa um pouco diferente das demais na medida em que seus participantes são pessoas inseridas nas lutas sociais do dia a dia, no Brasil, com ou sem participação na vida acadêmica, mas todas igualmente importantes como lideranças sociais de diferentes segmentos”, destacou Dulce Pandolfi.
João Pedro Stédile é economista, fundador e membro da direção nacional do Movimento dos Trabalhadores Rurais sem Terra, o MST, um marco no Brasil a partir dos anos 90. Para a coordenadora da mesa, apesar de estar enfrentando hoje algumas dificuldades, o MST é uma referência para o movimento social brasileiro.
Itamar Silva é fundador do grupo Eco, do Morro Santa Marta, diretor do Ibase e uma das lideranças mais importantes do Rio à frente do movimento das favelas pelo direito à cidade. “Ele vai falar de sua percepção da cidade, como ela incorpora a população mais pobre, sobretudo neste momento que o Rio está vivendo de se preparar para sediar os grandes eventos internacionais como a Copa do Mundo e as Olimpíadas”, disse Dulce.
A terceira participante da mesa é a socióloga pernambucana Betânia Ávila, estudiosa do feminismo e dirigente da Organização Não-Governamental SOS Corpo, uma referência no nordeste. Betânia tem pesquisas com empregadas domésticas, trabalhadoras rurais e na mesa do I Congresso do Centro Celso Furtado vai contar um pouco dessa experiência de associar o trabalho acadêmico com o movimento social e a direção de uma ONG. “Ela vai trazer também a contribuição para o debate dessa fronteira, a questão da institucionalização dos movimentos e da autonomia de uma entidade, os pontos de aproximação e distanciamento entre eles”, explicou Dulce Pandolfi, ela mesma uma estudiosa dos movimentos sociais.
De acordo com a pesquisadora da FGV, esse é um conceito histórico. “Os primeiros movimentos sociais surgem na Europa por iniciativa dos trabalhadores, para fazer frente à revolução industrial. São movimentos com uma visão socialista e revolucionária do mundo, que mais tarde passaram por transformações e hoje estão presentes em diversos setores da vida social, como os movimentos culturais, ambientais, de gênero, de etnias, pela paz, etc. Eles foram se diferenciando tanto do ponto de vista de sua estrutura quanto de seus objetivos políticos, se radicalizando mais em alguns momentos e menos em outros. Essa é uma discussão importante para entendermos as transformações por que passam os movimentos sociais, transformações que não significam necessariamente um recuo, mas uma adaptação aos novos tempos”, disse Dulce.
Nesse sentido, explicou, eles têm um papel fundamental para a questão do desenvolvimento. “Não existe democracia sem cidadania, nem cidadania sem participação. E participação é quase sinônimo de movimento social. Por isso, os movimentos sociais são cruciais para fazer avançar a cidadania, a democracia e o desenvolvimento”.