APRESENTAÇÃO
O que é desenvolvimento econômico na atualidade? Para instigar esse debate, Cruz e Gonçalves entrevistaram, para esta edição do Boletim, o professor Dani Rodrik, que tem aportado ideias novas ao debate acadêmico internacional, sem deixar de enfatizar o papel das políticas públicas para o desenvolvimento. Para Rodrik, na atualidade é a indústria de serviços – e não a agricultura ou a indústria manufatureira – que tem maior capacidade de oferecer um grande número de bons empregos e promover o desenvolvimento, com crescimento inclusivo e ambientalmente sustentável, em países como o Brasil. Mas, para tanto, os governos devem promover um ambiente que estimule o potencial de inovação das empresas, de baixo para cima.
Para pensar sobre o Brasil atual, incluímos nesta edição uma seção especial intitulada Retratos do Brasil no Censo Populacional de 2022. Nela, o artigo de Mendes, Araujo, Colombo, Vasconcellos e Leite analisa o conjunto de municípios que apresentaram as maiores taxas de crescimento populacional entre 2010 e 2022, confirmando a tendência de interiorização da população, notadamente para as regiões Norte e Centro-Oeste, e principalmente em municípios pequenos dentro da hierarquia da rede urbana. Os autores chamam a atenção para os municípios com taxas de crescimento anuais superiores a 1,5%, apontando que cerca de 60% destes tinham até 30 mil habitantes e, portanto, menores capacidades institucionais, sugerindo a constituição de consórcios municipais que permitiriam concentrar esforços para aumentar a oferta de serviços públicos nessas cidades.
Em um outro recorte dos dados do Censo de 2022, o artigo de Cruz, Ribeiro e Silva Filho apresenta os resultados de uma análise espacial, para os municípios que fazem parte das áreas de atuação dos fundos constitucionais de financiamento da política regional, para as regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste. Os autores analisam as correlações espaciais entre as taxas relativas de crescimento populacional, produto interno bruto (PIB) municipal e empréstimos dos fundos constitucionais de financiamento, ilustrando, através de mapas, os clusters de municípios formados por cada uma dessas variáveis, assim como as correlações entre elas.
Os dados recentes para os municípios que fazem parte da faixa de fronteira terrestre (FFT) do Brasil são analisados por Moura, que mostra a distribuição, os domicílios e o crescimento da população, e salienta os diferenciais quanto à composição da população por cor ou raça, idade e sexo, em especial à presença indígena na faixa de fronteira. As informações atualizadas confirmam a diversidade existente nesse recorte espacial e apontam dinâmicas populacionais que ultrapassam os limites do território brasileiro.
A seção especial traz também um artigo sobre a Periferia Metropolitana de Brasília (PMB). O exame revela um grande crescimento populacional (cerca de 30%), domiciliar (cerca de 95%) e das manchas urbanas (cerca de 36%), o que indica reconfigurações territoriais em curso. O estudo constata ainda, através de análise de imagens, o parcelamento de glebas rurais periféricas, originando conjuntos habitacionais desarticulados da malha urbana, além de um processo de expansão em estágio embrionário ainda não refletido nos dados do censo.
Nesta edição, apresentamos mais oito ensaios sobre temas diversos. Funari, Dias, Teixeira e Costa apresentam dados atualizados do Índice de Vulnerabilidade Social (IVS), utilizando dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (PNAD Contínua), agregados por estado. A evolução do IVS entre 2018 e 2022 mostra que, após um período de oscilações, houve um forte aumento da vulnerabilidade em 2021, como reflexo da pandemia, mas no ano seguinte o sinal foi revertido, e o indicador apresentou uma forte queda, em todos os estados. Porém tal reversão ocorreu no cenário específico do ano eleitoral, 2022, quando o governo federal aumentou os pagamentos do auxílio emergencial, com impactos
apenas momentâneos sobre o componente da renda do indicador.
O IVS também é tratado no artigo de Teixeira, Freitas, Effgen e Costa, que apresenta um exercício de territorialização do indicador para regiões específicas, a saber: a Amazônia Legal, a faixa de fronteira, os municípios defrontantes com o mar e o semiárido. Comparando o IVS de 2000 e o de 2010, os autores destacam, através de mapas, a redução do indicador
de vulnerabilidade na Amazônia Legal e no semiárido no período considerado.
O tema do planejamento urbano em âmbito federal é abordado por Francisconi, que apresenta um resgate histórico das sete Políticas Nacionais de Desenvolvimento Urbano (PNDUs) que foram elaboradas (nem todas finalizadas) no âmbito da administração pública federal nos últimos sessenta anos. O autor ressalta que, a despeito da importância do planejamento urbano em âmbito nacional, muito pouco das sete políticas elaboradas no Brasil foi usado para sustentar decisões do setor público.
Mendes e Santos apresentam uma contribuição importante para o debate em torno das concessões onerosas e privatizações no setor de saneamento básico, notadamente nos serviços de água e esgotamento sanitário. Utilizando dados sobre o destino dos recursos das outorgas ocorridas recentemente no Rio de Janeiro e em Alagoas, os autores mostram que, enquanto em Alagoas a função “saneamento” do orçamento público foi a mais beneficiada com recursos das outorgas, no Rio de Janeiro os recursos foram, principalmente, para as funções orçamentárias “transportes e urbanismo”. Tais resultados apontam que o principal argumento em favor das outorgas onerosas, qual seja, aumentar os investimentos para ampliar a cobertura dos serviços de saneamento básico em áreas deficitárias, nem sempre é confirmado.
Ainda sobre saneamento básico, o artigo de Santiago discute os desafios institucionais para a implementação da Política Nacional de Resíduos Sólidos (PNRS), destacando um rol de ações necessárias para sua efetivação, entre elas o fortalecimento do Ministério do Meio Ambiente para coordenar a implementação da política, os mecanismos de financiamento
para os municípios de menor porte e a promoção de educação ambiental para sensibilizar a população sobre o problema.
A heterogeneidade da agricultura brasileira é abordada em dois artigos. Freitas e Castro trazem uma discussão sobre as desigualdades tecnológicas na produção agrícola brasileira mostrando que os valores alocados em Assistência Técnica e Extensão Rural (Ater) no Brasil permanecem baixos desde a década de 1990, excetuando alguns momentos de crescimento. Os autores ressaltam a relevância da Ater pública para a agricultura familiar, e a importância dessa política para aumentar a produtividade neste segmento.
Em outro artigo, Freitas analisa o aporte do setor agropecuário voltado para o mercado externo para os resultados da balança comercial brasileira entre 1989 e 2022, identificando os produtos com maior participação nos superávits comerciais. Os resultados apontam para a manutenção de alta demanda desses produtos no mercado internacional para os próximos anos, à medida que o processo de urbanização em diversas nações continua a gerar novos consumidores, notadamente na Ásia.
Finalmente, Seixas, Saccaro Junior, Oliveira e Vargas discorrem sobre a Lei de Liberdade Econômica, e seus possíveis impactos sobre o direito urbanístico, em especial no que diz respeito aos processos atinentes à classificação de risco das atividades econômicas.
Boa leitura!
@s Editor@s