Por Claudia Leitão
A Cúpula de Ação em Inteligência Artificial (IA) assumiu recentemente como seu maior desafio o enfrentamento da hegemonia dos interesses de grandes grupos econômicos e de seus impactos no desenvolvimento tecnológico e na governança das nações. Mariana Mazzucato alerta sobre o perigo da dominação das “Big Techs” sobre a IA, capturada pelos usos tortos e escusos da plutocracia global. Afinal, a IA não pode ser refém do mercado, mas instrumento de emancipação das populações. Ora, os avanços tecnológicos são, em sua grande maioria, resultado de investimento público, embora acabem sempre sendo apropriados por discursos “liberais” que esvaziam e deslegitimam o Estado de suas funções.
O “Departamento de Eficiência Governamental” de Trump, conduzido por Elon Musk, simboliza, em sua recente ação de demissões em massa, o desprezo pela expertise do Estado e sua capacidade formuladora de políticas públicas. Triste ironia. Foram os subsídios governamentais de 5 bilhões de dólares que permitiram à Tesla de Musk a sua existência e sustentabilidade. Em meio a um turbilhão de algoritmos, instrumentalizados para a proliferação de conteúdos ilegais e engajamentos suspeitos, o Estado deve assumir novas tarefas, reconhecendo a importância estratégica do conhecimento aberto e o valor das novas economias dispostas a quebrar o domínio e o controle de dados em favor do conhecimento produzido entre e para todos. Ronaldo Lemos nos lembra que “o Brasil é um laboratório permanente de experimentação” e observa, que “temos uma imensa capacidade de absorvermos e remixarmos referências externas, criando algo totalmente novo e original”.
Essa vocação é um ativo essencial para que possamos avançar rumo a um outro desenvolvimento. Por isso, é impossível abrir mão do Estado (executivo, legislativo e judiciário) e de seu compromisso com novos marcos legais para a inovação, a inteligência artificial e a economia criativa. Como enfatiza Mazzucato: “não se trata de escolher entre inovação e regulamentação, mas de criar incentivos e condições para direcionar os mercados a entregar os resultados que desejamos como sociedade”.
O artigo foi publicado originalmente no jornal O Povo e é assinado pela Claudia Sousa Leitão – Diretora do CICEF, Socióloga, Doutora em Sociologia pela Sorbonne – Paris V e Mestre em Direito pela Universidade de São Paulo. Possui experiência como Secretária da Cultura do Ceará (2003-2006), Secretária da Economia Criativa do Ministério da Cultura (2011-2013) e Diretora do Observatório de Fortaleza (2017-2020).